Sábado, 23 Novembro 2024

Adelto Gonçalves* Jornalista, é assessor de imprensa do Grupo Fiorde, constituído pelas empresas Fiorde Logística Internacional, FTA Transportes e Armazéns Gerais e Barter Comércio Internacional (trading company).

Aprovado em dezembro do ano passado pela Câmara dos Deputados e atualmente em prazo de recebimento de emendas, o projeto que institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar) aguarda votação no Senado. A previsão é que o BR do Mar seja aprovado até julho, o que deverá contribuir para reduzir o número de caminhões e carretas nas rodovias do País. É o que se espera.

Hoje, segundo estudo realizado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), 162,9 milhões de toneladas são transportadas por ano por meio da cabotagem, 11% do mercado, enquanto o sistema rodoviário é responsável pelo transporte de 62% das cargas. Reduzir essa distorção e minimizar a ocorrência de roubo de cargas e de acidentes nas rodovias, além de diminuir os danos causados à malha rodoviária, estão entre os principais objetivos do BR do Mar, que pretende ainda estimular a concorrência e a competitividade na prestação do serviço, ampliar a disponibilidade de frota e incentivar a formação e a capa citação de trabalhadores.

Entre as principais mudanças previstas pelo projeto de lei nº 4.199/2020, está a liberação progressiva do uso de navios estrangeiros para esse tipo de transporte, sem a necessidade de contratação de construção de embarcações em estaleiros brasileiros. Com o BR do Mar, o governo espera reduzir o chamado custo-Brasil, conjunto de dificuldades estruturais, burocráticas, trabalhistas e econômicas que impedem o crescimento da produção industrial e do comércio.

Demorou, mas parece que os parlamentares e o governo federal descobriram que num país com 7.367 quilômetros de costa a navegação de cabotagem deveria ser a mais livre possível, de forma a realmente tornar factível a sua utilização, tanto no aspecto prático como no econômico. É o que se espera dessa nova legislação, sob pena de, ao não se levar em conta essa evidência, o Brasil continuar a oferecer valores operacionais mais caros do que os praticados em rotas inte rnacionais, como ocorria com frequência nos tempos da antiga Superintendência Nacional de Marinha Mercante (Sunamam).

De acordo com o projeto original e as emendas a ele adicionadas pela Câmara, as empresas de navegação não terão a obrigatoriedade de possuir embarcações próprias, ao contrário do que prevê a legislação ainda em vigor. Em tese, isso contribuirá para que se aumente a disponibilidade do serviço. Mais: as empresas poderão fretar navios, inclusive estrangeiros, o que ajudará a ampliar a capacidade de transporte. O fretamento poderá ser feito por seis me ses, prorrogáveis por até 36 meses.

Por outro lado, é bem provável que essa abertura venha a prejudicar a indústria naval, que hoje conta com o Fundo da Marinha Mercante (FMM) que tem como principal fonte de recursos o Adicional de Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), que incide tanto na cabotagem como na navegação de longo curso. Mas, na verdade, como só sobrevive com a ajuda desses recursos, a indústria naval corre o risco de passar por um célere processo de desaparecimento, se os benefícios previstos não forem efetivamente implementados.

Acontece que, nos últimos dez anos, segundo dados do Ministério da Infraestrutura, apenas quatro navios foram construídos, excluídas as embarcações do setor petroleiro. Portanto, é um setor inoperante, que pouco cresce, apesar da forte proteção que recebe do governo federal. Portanto, se desaparecer, não deverá fazer muita falta.

Com a abertura do modal para a participação de navios estrangeiros, o custo do frete deverá cair, permitindo a migração das cargas das rodovias para a cabotagem. Mas o importante é que haja a regularidade no serviço, pois o responsável pela carga precisa ter certeza de que a mercadoria será entregue no porto e chegará ao seu destino no tempo previsto, o que só será possível se houver uma oferta constante do serviço, ou seja, que haja disponibilidade de embarcações.

Se não houver essa confiabilidade no serviço, está claro que o embarcador continuará a apostar no transporte rodoviário. E para a cabotagem continuará a sobrar apenas parte da carga de granéis líquidos e sólidos, que são de grandes volumes e baixo valor agregado.

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